Como será a agência de publicidade do futuro? Essa é uma reflexão impossível de ser analisada de maneira desassociada dos fenômenos interdisciplinares que nos cercam.
É chover no molhado falar que a tecnologia mudou os modelos de consumo. Antes, as pessoas tinham uma relação quase que passiva para consumir os anúncios. Agora, graças aos mecanismos de segmentação de audiências e análises de dados, é possível produzir conteúdo direcionado para gerar resultados facilmente mensuráveis.
Quanto vale uma ideia?
Existe uma equação intangível para compreendermos o valor de uma agência de publicidade: quanto vale uma ideia? Acontece que, durante muito tempo, a percepção de valor de uma ideia acabou sendo embalada por práticas cada vez menos sustentáveis, como a leitura de que o que existe por trás de um processo criativo é algo único, divino e maravilhoso. Quantas vezes, ao ouvir um diretor de criação defender um anúncio, me pareceu o Gustav Klimt cheio de gestos explicando o Beijo, ainda que isso fosse possível.
O erro de muitas agências foi o de investir mais na embalagem do que no produto. A caricatura de genialidade perdeu espaço e os festivais de criatividade parecem velhas senhoras ostentando as joias da família. O modelo passivo e lento do briefing/solução é velho. O mercado exige iniciativas em tempo real. A descomplicação é o caminho mais curto para compreendermos que uma marca é um organismo vivo.
Considerando que marcas são organismos vivos, precisamos aceitar que elas devem ter personalidade, humor, tom de voz e opinião política. A mensagem não é mais uma cantada de bar. Os esquemas de comunicação precisam ser mais esféricos. Chegamos a um novo patamar onde o engajamento é mensurado quando o usuário se apropria do conteúdo, e não o contrário.
Um erro grosseiro e frequente é o de insistir em colocar goela abaixo uma adaptação das campanhas ATL para modelos que devem funcionar em BTL. Enquanto a comunicação off tem como premissa atingir o máximo de pessoas com um conceito, é no on que esta mensagem consegue ser personalizada em escala. Portanto, “adequar” uma campanha de outdoor para rede display é aproveitamento zero quando um conceito macro pode ser habilitado para comunicar com nichos segmentados de compra.
Qual é a cara da agência de publicidade do futuro?
Na minha opinião, essa é uma conversa muito mais complexa do que a pretensão deste texto. Tentando não ser minimamente irresponsável, considero que esses três pontos são essenciais para apontar um novo rumo para os modelos de comunicação.
Aceite que o tempo é real.
Vamos repensar a relação com o tempo. O Uber e o Airbnb não seriam modelos que têm muito a nos ensinar? Enquanto agências perdem tempo colocando purpurina nas embalagens das ideias, o clima já mudou. As marcas não procuram mais um portfólio de anúncios, querem cases consistentes. Buscam por agências de espírito livre, mas que sejam capazes de mudar a estratégia rapidamente quando necessário. É bom lembrar que a gestão horizontal, além de ser ágil, também tem como premissa a redução de custos operacionais.
Busque por novos modelos de remuneração
O modelo de remuneração de 20% de mídia já não é bem visto há muito tempo. Quando asteroides como o Facebook e o Google estruturaram um formato de compra direto, já estava claro de que seria uma questão de tempo para retirar o intermediário desta operação. O modelo de remuneração das agências passou por poucos processos de inovação. Hoje, alguns adolescentes rebeldes, como a AKQA, não compram mídia para os seus clientes.
Seja uma agência de performance de marca
A comunicação sempre será um processo humano. A tecnologia orientada por dados, a inteligência artificial e os algoritmos devem ser entendidos como ferramentas capazes de personalizar a mensagem em escala, e não de criar a mensagem em si. A agência do futuro precisa ter o DNA criativo para uma gestão 360º de uma marca. Deverá ter o faro para se apropriar, com a devida vênia, dos novos padrões de consumo, tendências e patchworks culturais que viralizam nas redes sociais a cada minuto.
A agência do futuro precede um novo jeito de pensar no modelo entrega de cliente e retorno financeiro. O que é certo é que as empresas vão continuar sua busca pelo melhor custo-benefício, sempre apertando os cintos dos seus orçamentos. A evolução vai preservar quem souber fechar essa equação e colocar em exposição os mamutes da Sibéria que não conseguiram deixar claro qual é o valor de uma boa ideia.